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Getúlio DormelesVargas |
Nossa democracia, até nos dias de hoje, se
revela frágil, caminhando sempre sob um plúmbeo manto de dúvidas, de ameaças
veladas, vendo o flerte traiçoeiro com velhos regimes, ora com a ditadura, ora
com o absolutismo da monarquia, ora com o anarquismo nebuloso.
Desde a proclamação da República, em 1889, o
sonho democrático continua parcialmente realizado, nunca se fez completo. Sofreu
interrupções que se alongaram nos anos, penou com a resistência dos velhos
coronéis, passou pela experiência cheia de contradições do Estado Novo de
Getúlio Vargas, que surfava entre o corte draconiano dos direitos institucionais
e da cidadania e a sólida decretação do conjunto mais generoso dos direitos
trabalhistas, até hoje inconteste e não superado.
Esse regime ditatorial caiu em 1945, o que
permitiu que o país entrasse num esperançoso ensaio de democracia. Voltamos a
ter eleições gerais, ressurgiram os títulos de eleitores, eclodiram os comícios
em praça pública, as loas à liberdade e à igualdade, voltaram os governadores no
lugar dos interventores, reabriram-se as Câmaras de Deputados e de Vereadores,
gozávamos das graças da sonhada democracia.
Mas até quando durou esta nossa festa? Em 1945
elegemos um militar que foi colaborador de Getúlio, o Marechal Eurico Gaspar
Dutra, que dizem que era tão feio que ao inaugurar um poço de petróleo da
sagrada Petrobrás, com um charuto na boca, quando pôs a cabeça para olhar o
fundo do poço de dentro ouviu de um operário: - “Não, moço, aqui não!”
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Juscelino Kubtischeck de
Oliveira |
E também feia era a nossa recém renascida
democracia. Dutra preparou a volta gloriosa de Getúlio na eleição de 1950. E
como o ex-ditador agora eleito terminou seu governo? Com um tiro no peito e uma
carta à Nação, em que revelava sua vergonha pela descoberta do “mar de lama” que
envolvia o Catete, palácio central do Governo. Foi o povo que saiu às ruas para
combater a corrupção? Foi? Foi não! Getúlio teve o enterro mais concorrido da
história do Brasil! Foi o oportunismo de um reacionário de extrema direita,
migrado do antigo Partido Comunista, o jornalista e chantagista Carlos Lacerda
que envenenou a imprensa e setores militares até obter a abdicação do chefe de
Estado. Isso foi em 24 de agosto de 1954, a eleição estava agendada para 1955.
Ganhou-a o mineiro Juscelino Kubitscheck de
Oliveira. Tudo calmo então? Nada disso. As forças fustigadas por Lacerda,
reunindo velhos coronéis, militares e igreja conservadora decidiram impedir a
posse do eleito, marcada para 1º de janeiro de 1956. Não fosse o espírito
legalista e a vocação democrática do Ministro da Guerra (antigo nome dado ao
Ministro do Exército), General Henrique Teixeira Lott que, demitido do posto em
novembro de 1955, resistiu no cargo, enfrentou o presidente em exercício, Carlos
Luz e abafou o movimento golpista.
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Jânio da Silva Quadros |
Tudo em paz, ganhou a democracia! Será mesmo?
Seria tão bom, se isso fosse verdade. Juscelino governou até dezembro de 1960,
ano em que inaugurou Brasília, sua grande obra. Em 1º de janeiro de 1961 passou
a faixa presidencial para o novo fenômeno político-eleitoral do país, Jânio da
Silva Quadros, ex-prefeito e ex-governador de São Paulo, que vinha fazendo uma
carreira fulminante de sucesso. E quanto durou isso?
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João
Belchior Marques Goulart (Jango) |
Sete meses! E meio! Em 24 de agosto (a data
sinistra), de forma surpreendente e até hoje muito mal explicada, renunciou ao
cargo de presidente, enviando uma carta ao Presidente do Congresso Nacional,
Paschoal Rainieri Mazzilli, anunciando seu inesperado gesto, jogando a culpa
nas “forças ocultas” que o impediam de governar. Seu vice-presidente, João
Belchior Marques Goulart (Jango) estava fora do país, em visita à China, região
do mundo proibida aos “democratas” do Ocidente. Jânio deixou para enviar seu
ministro da Justiça, Pedroso Horta, ao Congresso Nacional com a carta-renúncia
na mão, numa 6ª feira, às 15 horas. Era sabido, até pelas criancinhas, que os
deputados desapareciam de Brasília desde a 6ª feira de manhã. Qual era a
intenção de Jânio? Não arrisco dizer. O que ele não esperava é que os deputados,
macacos velhos, percebendo as intenções do presidente, resolveram não viajar,
lotaram o plenário, leram a carta, aprovaram a renúncia e empossaram o
presidente da casa, Rainieri Mazzilli, na presidência do Brasil.
João Goulart voltou, encaminhou-se para a posse,
mas foi impedido de fazê-lo. Militares e grupos políticos não aceitavam como
presidente um camarada que visitou a China Comunista de Mao Tse Tung, em missão
oficial, a mando de Jânio Quadros. Estava feita a lambança! Aí entrou a “turma
do deixa disso”. Liderada por Tancredo Neves, o avô do Aécio, apoiada por
Ulysses Guimarães, Juscelino, Afonso Arinos e outros “notáveis”, obteve-se um
acordo que instaurou, por decisão do Congresso, o Governo Parlamentarista, em
que o Presidente era Tancredo e o Primeiro Ministro era o João Goulart. Pouco
depois, num plebiscito, o povo fez voltar o presidencialismo.
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Tancredo Neves |
José Sarney |
Jango teve um governo tumultuado, o Brasil viveu
então uma época marcada por fervente movimentação política, enorme efervescência
ideológica até chegarmos ao golpe militar de 1964, quando os velhos golpistas
que o Marechal Lott impediu de tomar o poder em 1955, conseguiram finalmente
realizar seu intento. Aí todos vocês sabem, é história recente, passamos a viver
os “anos de chumbo” da ditadura militar, um regime de exceção em que ficaram
suspensos os direitos civis e fragilizada nossa cidadania.
Novamente Tancredo e seus velhos companheiros
levantaram um movimento que empolgou os brasileiros, o movimento das “Diretas
Já”!”. Era o ano de 1984, quer dizer, fazia 20 anos que vivíamos numa ditadura.
Em 85 os militares permitiram a eleição indireta de Tancredo Neves, que ganhou,
mas não levou. Lembram-se? Quem foi que ganhou a presidência depois da queda do
ditador Getúlio Vargas, em 1945? O seu ex-ministro, General Dutra, também seu
amigo e apoiador.
E quem foi que ganhou “de graça” a presidência,
com a morte de Tancredo? Um homem que teve sua carreira política todinha regada
pelos militares do período ditatorial, o incrível José Sarney. No próximo ano a
nossa nova Democracia completará 20 anos de idade! Será que ela vai chegar à
maioridade? Aos 21 anos? |