Há poucas semanas atrás, meu
amigo Sinibaldi Del GuércioFº publicou uma série extensa de
casas residenciais, comerciais e terrenos desocupados que
encontrou, ao dar seus giros pelas ruas da cidade. Como aquelas
fotos me atiçaram a memória e a curiosidade, tive a pachorra de
salvá-las numa pasta para poder contemplá-las mais
demoradamente, para ver o que tanto me atraía nelas.
No início eram casas com aspecto
de deterioração e abandono, depois essas foram escasseando e o
persistente “repórter” fotográfico passou a publicar fotos de
casas fechadas há um bom tempo. Eram casas de todos os estilos e
tamanhos, geralmente bem cuidadas, embora desabitadas.
Aquelas imagens, vez por outra,
tomavam conta de meu pensamento, na busca de seu significado tão
intrigante. As idéias foram se clareando, novas impressões se
manifestaram e, num repente, consegui decifrar o enigma.
As casas fechadas e conservadas
não tiveram muita importância na minha indagação, significaram
apenas que nossa cidade atravessa uma estagnação imobiliária no
terreno da locação de imóveis, fato que vem ocorrendo em quase
todos os municípios de porte médio e pequeno. As casas
abandonadas sim; tiveram um significado considerável na minha
reação à sua visão. Era o novo se apresentando ao antigo morador
da velha Itápolis, pois era raríssimo ver, nos velhos tempos,
uma casa residencial ou um terreno, fosse em que lado da cidade
fosse, em estado de deterioração e de abandono.
Contavam-se nos dedos as casas
“assombradas”, como chamávamos as casas abandonadas. As casas
dos anos 30, 40, 50 viviam ocupadas por proprietários ou
inquilinos. O que se via fechado, principalmente depois da 2ª
Guerra Mundial, que durou de 39 até 45, eram os salões
comerciais, que havia em grande número por causa da crise que
vitimou nosso comércio. Mas, mesmo assim, o que permaneciam
fechados eram os salões, com suas portas de aço baixadas, mas na
parte dos fundos residiam famílias.
O que explica porque quase não
existiam imóveis ociosos é que não havia especulação imobiliária
naqueles tempos, os aluguéis eram bem suportáveis e os
proprietários não especulavam só as alugando quando alcançassem
um alto preço.
Dificilmente você via uma família
mudar-se de casa por economia no aluguel, os preços eram
nivelados por baixo, não havia vantagem em enfrentar todo o
desconforto da mudança. Essa situação confortável dos inquilinos
era refletida na economia do município, pois atestava a
estabilidade.
Era outra época, outra maneira de
encarar a vida, era outra cidade. Nela não havia esta competição
desenfreada que leva as pessoas a querer sempre mais, mais e
mais. Nela não havia esse consumismo doentio que leva as pessoas
a se endividarem de tal forma que se tornam inadimplentes, maus
pagadores. Não havia o maldito cartão de crédito com sua fúria
monstruosa em busca do lucro.
Naquela Itápolis não havia esse
ataque “tsunâmico” da propaganda, que pela televisão, pelo
rádio, por todos os meios, fazem a propagação da neurose
coletiva de comprar, de viajar a todo custo, de gastar, gastar,
gastar. Talvez seja por isto que muitos proprietários preferem
deixar fechados seus imóveis a correr o risco de não ver a cor
do aluguel, de ver um monte de contas de água, de luz, de iptu
acumuladas pra ele pagar.
|
Muro do
terreno acima da Livraria e Papelaria Progresso
|
Quanto aos terrenos baldios,
desocupados, alguns até que bem cuidados, outros com cara de
abandono, o que me lembro para lhes dizer é que, nos idos da
primeira metade do século passado, na nossa cidade, a gente não
via terreno abandonado; se era terreno limpo, sem construção ou
estava esperando o início de uma obra ou estava aproveitado
fosse para uma horta, uma plantação de milho, de mandioca, de
abóbora e, se fosse vizinho do proprietário, podia até servir
para guardar caminhão, dar pasto para animais utilizados em
serviços, ficar com jeito de abandonado é que não ficava.
Lembro-me bem que, na antiga rua
XV de Novembro (Valentim Gentil), na quadra entre a Rua Barão do
Rio Branco e a Rua Ruy Barbosa (Odilon Negrão), vizinho de cima
da Livraria e Papelaria Progresso, do Roberto Del Guércio, havia
um terreno desocupado e descuidado; o mato crescia que era uma
beleza.
Esse terreno ficava bem em frente
ao portão da entrada lateral do Ginásio. Aquilo vinha de muito
tempo; um dia alguém entrou e colocou uma placa com o aviso:
“PROIBIDO CAÇAR ONÇA”. Aquela brincadeira despertou os
itapolitanos, que começaram a indagar por que ninguém tomava
nenhuma providência a respeito, até que entrou um prefeito, se
não me engano o Tarquínio Bellentani, que criou uma multa pesada
para terrenos abandonados, o que obrigou o proprietário daquele
abrigo de onças a abandonar aquela especulação imobiliária e dar
uma finalidade para o dito terreno. |