Alguém se
lembra da Dª Iría? Seu nome era pronunciado Irí-a. Ela viveu até
os anos 50, ali no nosso pedaço, na esquina da Av. Valentim
Gentil com a Rua Ricieri A. Vessoni, numa casa alta, com
alicerce e arrimo de pedra-fogo. Era a casa dos Conti, da
Hermínia e do Chico.
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Corporação Musical Vitório
Manoel III - 1920
Da esquerda para a direita, 1º
plano: Paschoal Del Guércio e Mário Tuena.
2º plano: Ângelo Cavichiolli,
Jospe Novazzi, Francisco Jannuzzi, Mário Pisa, César
Capela, Francisco godoy, Francisco Conti,
André Inácio e Antonio Celli.
3º plano: Thomaz Jannuzzi,
Jopsé Reato, Jácomo de Lucca, José Cavichiolli,
Leonardo Jannuzzi, Olinto Xavier (Serra Dourada),
Antonio Canciani, José Jannuzzi e maestro Raphael
Mercaldi. |
Francisco
Conti era guarda-livros e a Hermínia era funcionária pública. O
Chico tocava clarineta na nossa Banda. Da minha casa ali na
Francisco Porto, dava para ouvi-lo ensaiando quase todas as
tardes, depois que voltava do trabalho. Dª Iría cuidava da casa
e da comida, morava nos fundos da casa. Era uma senhora negra de
cabelos já branqueando, quando a conheci.
Os Conti se
mudaram dali, depois de aposentados e deixaram-na na casa. Ela
continuou nos fundos e alugava a parte da frente. O Jacintho e a
Zizinha, minha irmã, moraram um tempo ali; isso contribuiu para
que eu conhecesse melhor aquela boa senhora, que benzia caxumba,
dor d’olho, nome popular da conjuntivite e aplicava “língua de
vaca”, uma plantinha nativa que dava beirando as cercas e os
muros. Ela untava a folha, que se parecia muito com a da rúcula
e colocava sobre os furúnculos, cabeças-de-prego, tumores e até
espinhas inflamadas. Era tiro e queda, em pouco tempo a vítima
estava curada.
Dª Iría não
fazia disso profissão, ajudava quem estivesse precisando, sem
esperar nada em troca. Contou-me, a mim e à Zizinha, que também
adorava ouvi-la, que era neta de escravos e que chegou a ver
muitos de sua família serem açoitados no terreiro. Dª Iría ia
todas as manhãzinhas à igreja comungar, usava um xale preto
cheio de franjinhas que eu achava o máximo. Espero que ainda
haja gente aí na cidade que a conheceu e que ainda se lembra
dela.
Alguém aí na
terrinha ainda se lembra do popular Francisco Guzzi? O Guzzi foi
dono do mais famoso bar da cidade, o Boulevard Itápolis, que
funcionou na esquina da antiga Av. XV de Novembro, atual
Valentim Gentil e a Rua Barão do Rio Branco, onde hoje é a loja
Ao Preço Fixo. Depois o bar cedeu lugar às Casas Pernambucanas e
passou a funcionar no prédio contínuo, onde durou muitos anos.
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Francisco
Guzzi |
O Guzzi era
animadíssimo, gostava demais de carnaval, organizava os corsos,
os blocos e participava gostosamente da festança. Outra coisa
que ele gostava de promover era a vinda de artistas renomados
para se apresentar na cidade. Ele viajava para ir aos
espetáculos da época, às vezes em São Carlos, outras em Ribeirão
Preto e até em São Paulo e Rio de Janeiro, onde ele procurava se
aproximar do artista e fazia o convite.
Com a ajuda
do Guzzi, os itapolitanos puderam conhecer vários talentos
daqueles anos 30: Aurora Miranda, irmã mais nova da famosa
Carmem, Gastão Formenti, cantor romântico, conjuntos musicais
conhecidos, eram trazidos pelo Guzzi para se apresentar no palco
do Cine Theatro Central. O Guzzi ficou muito doente e foi viver
com seus parentes na região de Rio Preto. Não é que eu o vi por
lá? Casei-me com uma sobrinha de sua irmã Marizinha. Falamos
sobre Itápolis e ele me perguntou: “Você vai sempre lá?” Diante
da minha afirmativa, recomendou: “Dê um forte abraço no Mário
Castro, meu grande companheiro de carnaval!”
Vou citar
algumas pessoas e torcer para que ainda sejam lembrados. Alguém
se lembra do Targas, cunhado do Bepim Trevisan? Viveu aí e gozou
de boa reputação entre os itapolitanos.
Quem se
lembra do Ranulfo do Cartório? Cartório que funcionava na Av.
Campos Salles, bem em frente ao Posto de Gasolina que ainda está
lá, esperando ser tombado, pela sua arquitetura típica dos
postos de gasolina daquela época.
Quem será que
se lembra da Dª Vitória França? A bondosa mulher, que mancando
de uma perna, toda manhã andava até onde o cansaço chegasse,
alimentando os animaizinhos que viviam nas ruas, cãezinhos
sarnentos, gatos magricelas. Estou falando de pessoas que
viveram em nossa cidade, foram muito populares e fizeram a
alegria de muita gente.
Naqueles
velhos tempos nossa cidade tinha uma empresa de telefonia que
servia a cidade e todo o estado de São Paulo, a Companhia
Telefônica Brasileira, a CTB, antecessora da Telesp, cuja
agência funcionava num pequeno prédio ali no velho jardim, do
lado da Florêncio Terra, onde hoje funciona a Padaria São
Valentim.
Havia dois
tipos de aparelhos telefônicos, o de mesa e o de parede. Esses
aparelhos não tinham ainda o disco, para o usuário acionar a
chamada. Ambos tinham uma caixa com manivela, que acionada
ligava com a telefonista, personagem de enorme utilidade nos
velhos tempos.
Hoje, tempo
de celular, de i-phone e o escambau, é difícil aceitar a idéia
de como funcionava a telefonia da época. Você acionava a
manivela do telefone, logo ouvia a voz da telefonista que dizia
palavras do tipo: “Em que posso servi-lo?”, ou “O que o senhor
deseja?” – Você pedia e ela fazia a ligação.
E os números
dos telefones? Perto dos 8 e 9 dígitos de hoje, aquilo vai
parecer brincadeira. O telefone da Prefeitura era o de número 1,
isto mesmo, 1! O telefone de mais alto número era, em 1945, o
78, se não me engano era da casa do Sr. Tufai, que trabalhou um
tempo no DNC (Departamento Nacional do Café) que funcionava num
complexo de prédios e barracões na beira da Estrada de Ferro
Douradense, construções que, já nos anos 70, depois de vários
anos na inatividade, foram comprados pelo Jacintho Mazzo e
serviram para suas diversas atividades. Mas, voltando aos
telefones! Ninguém precisava guardar os números dos assinantes,
as telefonistas sabiam de cor! Você tocava a manivela e pedia:
“Por favor, me liga na casa do Dr. Marinho?” Pronto! Ligação
completada. Acontecia também de a telefonista nem tentar ligar,
ia logo dizendo: “Não tem ninguém em casa, eles estão viajando!”
Elas sabiam
de tudo a respeito dos assinantes! E quem eram estas fadas da
comunicação, você se lembra? Eu vivi aí criança e moço de até 19
anos, me lembro bem delas, de seus semblantes, de seus
parentescos e de onde moravam, não me lembro dos seus nomes, mas
sei que uma delas era da família Coletti, acho que era irmã do
Ismael, pois ambos se pareciam muito. Outra era da família
Januzzi e morava perto do Almoxarifado da Prefeitura. Havia mais
uma, já uma senhora, cuja figura está agora diante de mim, mas
da qual não me vem o nome.
As
ligações interurbanas eram caras e demoradas. O usuário pedia
uma ligação para Ibitinga, podia demorar uma hora; para São
Paulo, 5, 6 horas de demora, A telefonista perguntava: “A
ligação vai demorar cerca de 4 horas, o senhor espera?”
Até nos anos
90 o sistema era precário, uma linha telefônica custava uma
fortuna e o serviço deixava muito a desejar. Mesmo depois do
advento dos orelhões, das fichas, a coisa não melhorou muito.
Para arrematar, vou lhes contar uma passagem que me foi relatada
por um amigo que era perito da polícia técnica em São José do
Rio Preto.Ele havia combinado com a mãe dele de ir almoçar com
ela e a família lá em Nhandeara, cidade que dista uns 80
quilômetros de onde ele trabalhava. Ele estava de plantão
naquele domingo, mas assim mesmo combinou o almoço, porque “não
acontecia nada”, mas aconteceu. Acidente grave no trevo de
Catanduva, a viatura o conduziu até lá e a coisa estava
complicada. Quando viu a hora, resolveu avisar a mãe que não ia
dar pra ir. Como não tinha ficha, pediu à telefonista que
ligasse a cobrar. Naquele tempo a telefonista intervinha em
tudo. Ligou para o número pedido, uma voz de mulher respondeu
“alô” e a telefonista recitou sua fala habitual: “De Catanduva o
Sr. Fulano deseja falar a cobrar, a senhora paga?” (queria
dizer: a senhora está de acordo?) No que a voz respondeu: “Ai
aiai minha fía! Meu marido saiu e não me deixou nenhum trocado!
Como que eu vou pagar?” e bateu o telefone! |