Histórias que não foram escritas

Orestes Nigro

"Eles vinham para estudar"

A história do Lazinho Ramalho na entrada do cinema de Ibitinga tem como protagonista o Neu Miranda que, é bom que se diga, apesar do mico que pagou, recebeu os 50 cruzeiros na segunda feira seguinte, pois o Lazinho era muito correto.

Mas, falando do Neu, que nome estranho, não!?, mas era nome mesmo. Seu pai, o Sr. Miranda, fazendeiro vindo de Santa Adélia, gostava de dar nomes inusitados para seus filhos: o mais velho chamava-se Bas, em seguida vinha o Neu, depois o Bias e o caçula era o Nemrod. As meninas escaparam deste critério, pois eram a Maria Cândida e a Magali.

Essa família mudou-se para Itápolis nos meados dos anos 40, para que seus filhos, já formados no curso primário, pudessem estudar no nosso conceituado Colégio e Escola Normal Valentim Gentil.

Por um bom tempo foram nossos vizinhos, tendo ido morar na casa gêmea do Sr. Lutaif, na esquina da Francisco Porto com a Bernardino de Campos, na parte avarandada, em frente onde tem hoje uma tipografia (Ana Nery Ensino Técnico).

Dª Lavínia era muito caseira e só era vista quando resolvia passar um tempinho na janela, observando seus filhos quando conversavam com amigos na calçada. O Sr. Miranda passava a maior parte do seu tempo na sua fazenda, na região de onde vieram.  O filho mais velho, o Bas, já não era estudante, pois ajudava o pai na lida com as propriedades rurais. Namorou, noivou e casou-se com a filha mais velha da Dª Iole e do Sr. Antonio Cauduro, a Odysseia, que era uma moça muito bonita, comunicativa, jogava vôlei e basquete quando estudava no “Valentim”.

Infelizmente a felicidade do casal durou pouco, pois o Bas, que comandava o desmatamento das terras recém adquiridas pela família no Norte do país, foi vítima de um acidente fatal, esmagado que foi pelo tronco de uma árvore gigante. Lembro-me da tristeza que cobriu os itapolitanos na época, pois o Bas, assim como toda sua família, já haviam conquistado a simpatia de todos.

08 de janeiro de l949, em Itápolis - OESTE 6 X IPIRANGA DE CATANDUVA 4

Da esquerda para a direita, em pé: Carlos Dultra, Neu Miranda, Anuar, Élio José La Laina, Milanês, Pelota e Oacyr Antonio Ellero (pé de pato)

Agachados: Irani Juliano, Luiz dos Santos (Careta), Dema, Didi e Rubinho

Obs.: Anuar, Milanês, Pelota, Dema, Didi e Rubinho eram do CAT de Taquaritinga

O Neu e o Bias estavam em todas as equipes esportivas do colégio e participavam de todos os torneios. O Neu era um tipo moreno, cabelos lisos e pretos, o Bias era mais claro, com sardas no rosto, cabelos castanho-claros. Namorou, noivou e casou-se com a Marília, filha mais velha de Dª Brígida e do Caetaninho Del Guércio, sua irmã chamava-se Marisa.

O Nemrod, o mais novo, recebeu nome do personagem bíblico, Nin-rod, que foi o primeiro homem poderoso da Terra. Nemrod, o mais baixinho e atarracado, era quase da minha idade, o que nos aproximou mais.

A Maria Cândida, que atendia pelo simpático apelido de Lilía (li-lía), era uma moreninha muito graciosa, demonstrava personalidade marcante e exercia liderança sobre as adolescentes à sua volta. A Magali, a mais novinha, era magra, de biotipo que indicava que ia ser mais alta que a irmã, tinha pele clara e salpicada de sardas, que lhe davam um certo charme. Depois de formados no “Valentim Gentil”, mudaram-se para Araraquara, em busca dos cursos universitários.

Naquela época, Itápolis atraía muitos jovens que vinham em busca de completarem seus estudos até o 2º grau.  Alguns vinham sozinhos, morando em casas de família, como pensionistas. Outros, porém vinham com suas famílias, como o caso dos Miranda.

Assim também veio a família do Sr. Rigueiro, fazendeiro de Borborema. Alugou a casa da esquina da Av. Valentim Gentil com a Rua Bernardino de Campos, que já fora até Posto de Saúde e lá moraram até seguirem os Miranda, mudando-se para Araraquara, em busca do mesmo objetivo. O casal Rigueiro tinha três filhas moças, todas altas, esbeltas, atraentes e, sobretudo, alegres e sociáveis. A Adélia era a mais velha e, na minha opinião, a mais bonita de todas. Tinha o tipo da atriz global Natália do Valle, pele clara, cabelos castanho-claros, sempre sorridente e comunicativa.

A do meio, Paulina, era mais retraída embora tão simpática. Alta também, era de uma beleza diferente da da Adélia, com sua pele delicada e rosada, emoldurada por seus cabelos negros, lisos e corte Chanel, Paulina tinha o tipo romântico, sóbrio e “glamouroso”.

A caçula, muito popular no meio estudantil, era a Leonildes, morena alta, cabelos levemente ondulados e agitados, participava com destaque de todas as atividades da juventude estudantil, tanto no esporte como nos bailes, reuniões festivas, shows. As Rigueiro deixaram muitas saudades nos corações dos jovens da época e muitos amigos que se referem a elas até nos dias de hoje.

De Santa Adélia vieram os Miranda, de Borborema, os Rigueiro. De Tabatinga vieram muitos estudantes que buscavam o nosso excelente “Valentim Gentil”. Tivemos estudantes de muitas cidades, como Taquaritinga, Itajobi, Novo Horizonte, Fernando Prestes, Matão, mas Ibitinga e Tabatinga superaram todas estas, é incontável o número de moças e de moços que vieram delas. E Tabatinga também nos mandou duas famílias, o McFadden e os Bueno.

Os McFadden eram três irmãos, que eu me lembro: a Solange, a Helen e o Jean-Claude. Típicos oriundos do Reino Unido, não posso dizer que eram loiros, pois os via brancos quase como a neve. Brancos, altos, magros e lépidos, parecia até que não tocavam o chão onde pisavam. E eram excelentes alunos, brilhantes, educados e discretos.

Os Bueno, vieram todos para Itápolis, o pai, Sr. Josias e esposa, com seus filhos Josmar, Josmaridei e Josmarina. Além deles, trouxeram uma sobrinha, a Deise. Instalaram-se numa casa vizinha do Lucilo Porto, ali na Av. 7 de Setembro, quase chegando na Av. Francisco Porto. Eram todos altos, bem claros.

O Josmar e a Josmarina tinham cabelos loiros, a Josmaridei e a prima Deise tinham cabelos castanho-escuros; eram todos alunos brilhantes, ótimos colegas, fizeram muitos amigos na cidade, por sua cativante simpatia e polidez. Eu os conheci jovens, solteiros, em plenos estudos. Espero que, como os Miranda, os Rigueiro, os McFadden, tenham sido muito felizes em suas carreiras e em suas vidas.

Toda esta gente se beneficiou da excelente qualidade de nossa principal casa de ensino e da hospitalidade inata da boa gente de Itápolis, mas também deixou na cidade o legado de sua civilidade, honradez e beleza de alma.  Junto deles, muitos estudantes vindos de fora ajudaram a elevar o conceito invejável de que gozavam nossas escolas. Por essa razão, essa crônica tem o condão de reverenciá-los, daí terminá-la com a citação dos nomes deles que ficaram em minha lembrança: os primos Damásio e Mauro Deri, os também primos Vidal e Cícero Haddad, Leontino Arantes, Sílvio Tozzi, Vitor Basílio, Wanda Tricai, que se casou com Idiomar Semeghini, todos de Ibitinga; Dirceu Sgarbi, os irmãos Abdalla e Jorge Miguel, hoje marido da Nilza Gentil, as irmãs Olinda e Alice Xavier, de Tabatinga; Milton Miller, Alice Guimarães, de Novo Horizonte; Maria Matheus, Osmar Passos, Waldomiro Renesto, que se casou com a Wandalice Franco, Huascar Pizzolante, Wilson Calegari, Renato e Marina Leme, de Borborema e muitos outros jovens desta região que tinham nossa querida terra como centro educacional.