Histórias que não foram escritas

Orestes Nigro

"Para as Famílias de Itápolis: 2 volumes"

 

O número de crônicas já escritas, focalizando as famílias itapolitanas dos anos 30, 40 e 50 e as que faltam escrever, é tão grande que nos obriga, a mim e aos meus colaboradores, Sinibaldi Del Guércio Fº e Valentim Baraldi, a dividi-las em dois volumes.

O objetivo desta divisão é para que ofereçamos aos leitores o mesmo estilo de edição do Volume 1, leveza, facilidade de leitura e de portabilidade.

O volume 2 deverá ser lançado durante as férias de julho próximo, num evento o mais parecido possível com o de 19 de julho de 2013. Aquele encontro com os leitores foi inesquecível, pela simpatia e acolhimento que recebi de todos, espero assim repetir a dose.

O critério de montagem dos dois volumes é cronológico, em outras palavras, começaremos com as famílias que viviam seu auge nos anos 30, seguidas das que ganharam sua afirmação nos anos 40 e finalmente as que surgiram no cenário local nos anos 50, pois nem todas que abordo já estavam formadas durante meus anos de infância, algumas nem viviam na cidade ainda. Acho este critério bem razoável.

Outro aspecto digno de destaque é o da limitação do autor a uma certa época da vida itapolitana. Imagino que muitos membros das famílias que abordei e já se tornaram públicas, seja por jornal impresso, seja pela Internet, sentiram alguma decepção por não verem focalizadas pessoas de sua família, vivas e atuantes nos dias presentes.

Eu até entendo que haja essa expectativa, é natural. Mas, peço que entendam uma coisa: minhas crônicas nascem da minha lembrança, daquilo que ficou registrado na minha memória e isso aconteceu no período em que vivi nesta cidade tão querida.

Hoje, se reunirem num recinto, uma multidão de itapolitanos e me desafiarem a identificar uma dezena deles, certamente ficarei frustrado, mesmo que todas estas pessoas provenham de famílias as mais antigas da cidade. Foram anos de ausência, longos períodos em que a vida estava voltada para o trabalho, a criação da família, mantendo minha cabeça voltada para questões de sobrevivência.

As lembranças guardadas de um tempo tão distante devem ser fruto da verdadeira veneração que eu sempre tive por minha terra natal e pela gente que nela vivia. Só isso pode explicar que eu feche meus olhos e veja com nitidez impressionante todos os cenários físicos e humanos da minha mais tenra Itápolis.

Aquilo que eu sentia por Itápolis, inspirado no exemplo de meus pais, de meus irmãos, de meus tios, primos, amigos e colegas de escola, aquilo era amor desinteressado, incondicional e amor incondicional não morre nunca, seja ele dedicado a alguém ou a alguma coisa, a uma cidade, por exemplo. As lembranças são, pois, a chave de minha motivação quando escrevo sobre minha terra natal, só as lembranças.

O que as famílias podem esperar dos meus escritos são as pessoas, os fatos, os costumes que guardo na lembrança. E ainda é preciso entender que cada um de nós tem seu jeito peculiar de ver as pessoas, as coisas e de sentir. Não se esqueçam que pertenço a uma família de trabalhadores, que mesmo numa época em que não havia discriminação de classes, os trabalhadores compartilhavam de eventos, mesmo de ordem social; frequentavam os mesmos ambientes, os mesmos salões de bailes e de festas, mas não alcançavam a privacidade dos agrupamentos sociais que lhes eram diversos.

Quando eu focalizo uma certa família o foco não é econômico financeiro, o foco é a forma de vida, as atividades e os entrelaçamentos dessas famílias, pois o que eu posso abordar é isso, já que não me era dado privar de todas as famílias. Eu falo das pessoas na cidade, nas ruas, nas praças, nos salões, nas quadras de esporte, nas escolas, onde o acesso era público e quando falo de como eram as casas por dentro, baseio-me nas casas onde eu entrava, onde era recebido.

Minha Itápolis da infância e juventude foi a responsável primordial pela minha formação como homem, como pensador, como intérprete da sociedade humana. Foi dessa etapa de minha vida que tirei os alicerces de minha personalidade, os princípios básicos que sustentam meu caráter.

Eu nunca olhei para meus vizinhos, para as famílias de meus colegas e amigos, pelo lado de suas posses ou da falta delas. Isso não é um privilégio meu, era a maneira com que todos olhavam seus semelhantes, pois vivíamos em tempos de simplicidade, de parcimônia, de valorização do ser, sem dar importância ao ter. Os meus contemporâneos que ainda vivem são testemunhas dessa afirmação. Foi esse tipo de comportamento humano que ficou gravado em minha memória,

E as lembranças estão se esgotando, a cada dia que passa sinto que me restam cada vez menos reminiscências a relatar aos meus leitores; isso já era previsível, pois dos quase oitenta e dois anos que vivi, só vinte foram na minha terra. Foram tão bons esses vinte anos, que nem a idade me faz esquecê-los.