Histórias que não foram escritas

Orestes Nigro

"Bom Princípio de Ano Novo!"

 

Na minha mais tenra Itápolis, desde os tempos de criança que, nestes dias de Festas, a gente esperava o amanhecer do dia primeiro do Ano Novo, para ouvir, bem cedinho, as vozes das crianças que batiam palmas no portão, dizendo bem alto “Bom princípio!”

Alguns eram mais explícitos e anunciavam “Bom princípio de Ano Novo!” Ouvida aquela saudação “desinteressada”, o barulho da janela que se abria, indicava que o menino, que tão cedinho estava acordado, teve seu esforço recompensado, alguma coisa estava ganhando.

Aquele movimento de crianças logo ao alvorecer era um costume tradicional das cidades brasileiras. Aquelas palmas, seguidas dos gritos de “Bom princípio”, não aborreciam ninguém, as pessoas já esperavam por aquilo, a maioria já tinha os brindes preparados para “agradecer” aquela saudação.

A maioria dava moedas, alguns um pacote de mantimentos típicos da época, outros um brinquedo, um par de meias, qualquer coisa que pudesse agradar os pequenos anunciantes de “Feliz Ano Novo” à moda antiga. Tinha gente que já tinha aqueles presentes embalados, à espera da hora do “Bom Princípio”, verdadeira instituição nacional.

Lembro-me que minha avó materna, a Vó Nenê, juntava, durante o ano inteiro, moedas guardadas num cofre, que seria aberto na véspera do “Bom Princípio”, para ser distribuído a todos os meninos que a acordavam naquela manhã carregada de alvissareiros sonhos. Naquele dia mesmo, o cofre voltava a guardar moedas para o próximo “Bom Princípio”.

 Os que não viveram aquela época podem pensar que o costume de “Bom Princípio”, era recurso de crianças pobres; os ativistas dos direitos da infância poderão denunciar o caráter de exploração das crianças por seus pais, mas não era nada disso. Aquela verdadeira festa do “Bom Princípio”, reunia meninos de todas as classes sociais, era uma festa da criançada.

É claro que havia uma maioria de crianças pobres naquelas manhãs tão encantada, afinal esse país sempre primou por ter uma população marcada pela desigualdade social. Aquela mescla de crianças de todo tipo caía tão bem na época do Natal, envolvendo a população num ato espontâneo de solidariedade e distribuição de calor humano.

A tradição do “Bom Princípio” já faz tempo que foi deixada de lado. Mas eu gostaria de me multiplicar num bando enorme de meninos e fazer o amanhecer dos itapolitanos, na primeira aurora de 2014, virar um momento mágico para todas as janelas da cidade, num coro maravilhoso a anunciar FELIZ ANO NOVO, GENTE ÁVIDA DE FELICIDADE! Mas na velha fórmula encantada e sincera do “Bom Princípio! Bom Princípio! Bom Princípio!”