Francisco José Santarelli

Memórias Políticas

 

 

"Histórias da Câmara Municipal"

Em minha crônica de hoje, relato fatos corriqueiros e alegres, que se observava tanto na política quanto popularmente de personagens pitorescos de nossa cidade.

Na minha primeira eleição, que competi para ser vereador, tínhamos um trabalho insano, de pedir votos e de entregar cédulas, como era ainda no inicio do regime democrático e procurávamos eleitores tanto na cidade como na zona rural.

Os funcionários públicos onde eu me incluo, tiraram seus títulos eleitorais, mesmo porque todo funcionário público era obrigado a fazê-lo. E dessa maneira, as três primeiras urnas eram na sua maioria de funcionários públicos e fui eleito, praticamente, com os votos dessas urnas.

O trabalho era grandioso, pois precisávamos entregar cédulas para serem colocadas nas urnas e como costumávamos toda noite ir ao bar dos Cardilli, aproveitei para solicitar os votos e entreguei uma cédula para cada um, porém sem esperança de ser sucedido, pois não pertenciam a minha facção política.

Na segunda eleição, ao entregar minha cédula ao José Cardilli, recebi como resposta o seguinte:

- Olha Chico, na outra eu não votei em você, porem nessa vou guardar a cédula e votar em você, pois gostei do seu trabalho como vereador.

Esse fato muito me agradou e agradeci.

Seguiu se a eleição e durante a apuração realizada no antigo prédio do Fórum e Cadeia, hoje Museu Histórico e Pedagógico Alexandre de Gusmão, tive novamente boa votação nas três primeiras urnas e nas posteriores foram abaixando. Na décima primeira tive um único voto. Vasculhei então a lista dos eleitores dessa urna publicada ali no corredor do Fórum e qual não foi minha surpresa, constatei o nome do meu amigo e cliente José Cardilli que me agradou, mas prosseguindo verifiquei que uma tia minha, também fazia parte dessa urna, o que fez com que ficasse com uma dúvida atroz - muito cruel. Resolvi não questionar para não deixar ambos em situação difícil.

À noite, como de costume, fui até o Bar dos Cardilli para um lanche e de pronto fiquei alegre quando o Zé adiantou-me que dessa vez eu tinha sido eleito pelo seu voto.

Agradeci e afirmei:

- Você tirou-me uma grande dúvida, pois nessa décima primeira urna, tive um só voto onde votou ali também uma tia minha. Vai ver que ela deve ter errado ou trocado de cédula e diante dessa minha afirmativa, tive a seguinte resposta:

1969 - Posse do Prefeito Tarquínio Bellentani  e do Vice Prefeito Dr. Francisco José Santarelli

1-Dr. Rubens Francisco de Arruda, 2-Dr. Idiomar Semeghine, 3-Mário Marques de Araújo, 4-Antonio Coletti, 5-Aldo Bonazzi, 6-Ismael Nery Palhares, 7-Dr. Francisco José Santarelli

- Olha Chico, não adianta mentir, fui com sua cédula no bolso, porém, no portão do Grupão estava lá o Ismael Palhares pedindo voto. Durante toda minha vida, quando ia ao sítio, passava pela sua oficina e quase sempre solicitava seus préstimos para conserto de máquinas, do trator ou até de mesmo peças e pensei:

- O Chico tem bastante voto. E por essa razão votei no Ismael, mas na próxima vou cumprir minha palavra”.

- Então eu disse: Só que eu também menti pra você, pois minha tia não vota nesta urna, não sei agora quem deu para mim esse voto.

Já durante toda legislatura, Ismael Palhares e eu éramos adversários porém amigos, o que não era comum naquela fase política de Itápolis. Outro amigo também da oposição, Francisco Sendon Garcia, era líder da sua bancada e além de ser oposição era descendente de espanhol, pois votava tradicionalmente contra, se bem que nada resolvia, pois era minoria.

Durante a construção de uma ponte no município um funcionário diarista sofreu um acidente e veio a falecer. Como não havia convênio com o INSS, antigo INANPS e o mesmo era casado e tinha três pequenos filhos, então apresentei projeto, pois naquela época o vereador também podia apresentar projetos, sendo remetido ao prefeito para aprovação do auxilio mensal e, dessa maneira, embora com uma quantia pequena resolveu o problema daquela família.

Em conversa antes do inicio de uma Sessão de Câmara, um vereador da oposição relatou-me que outra família passava por penúria em face do falecimento de um trabalhador braçal e pediu-me para apresentar projeto também para a família desse funcionário.

De pronto respondi que iria atender sua solicitação, porém queria constar o nome dele também no projeto, o que o deixou bastante contente.

Na sessão de votação, o presidente afirmou que quem era a favor da votação permanecesse como se encontrava e os contrários que se levantassem.

Tal vereador, que estava distraído no momento, recebeu um cutucão do seu líder  e votou contra, sem observar que era dele também o pedido.

Diante do meu desagravo, lhe falei:

- Você pede para fazer o projeto, põe seu nome e vota contra. Ele me respondeu:

- Desculpa, Chico, não observei que era votação da qual participava junto com você. O meu líder me cutucou e votei contra como de costume.

- Não fique aborrecido, o projeto foi aprovado e a família de seu amigo falecido será beneficiada.

Antes de encerrar a sessão afirmei que o Chico Sendon é oposição ferrenha, mas um grande amigo e também meu cliente, pois quando de sua ida para trabalhar em São Paulo continuou vindo para Itápolis. Além de meu cliente era um verdadeiro amigo e todos que citei nesta crônica, por coincidência, foram grandes amigos numa época de política acirrada em nossa cidade, pois não coadunava com a cultura e religiosidade de seu povo.